Por mais óbvias que sejam, existem situações na vida que
você acha que tão cedo não vai vivenciar. Existem aquelas pessoas que são tão
ícones que, por alguns instantes, você acha que não são humanos, e por isso
sempre estarão ali, presentes, como estátuas de cera que nunca mudam de
aparência; ou, talvez, só troquem de roupa e penteado. Não nos ocorre
que, como qualquer um de nós, elas estão sujeitas a frustrações, irritações,
erros e a morte.
Por isso é com imensa tristeza que soube, hoje, da morte da
apresentadora Hebe Camargo. Hebe fazia parte do restrito grupo de pessoas da
televisão que está se extinguindo, tal como Silvio Santos. Quando essa “leva”
de monstros da TV nos faltarem, o que nos restará? Comediantes stand-up? Modinhas do
Multishow e da MTV? Os babaquinhas do CQC e Pânico? Programas com fórmulas
enlatadas vindas dos EUA e Europa?
Por isso, além de perdermos mais uma parcela daquilo que
existe de mais icônico na TV brasileira, estamos, aos poucos, perdendo a
própria essência, a natureza, a originalidade, a qualidade da nossa
televisão (que cada vez mais perde sua brasilidade) com a partida de Hebe
Camargo.
Os programas de Hebe, durante toda a sua vida, não eram
dados a intelectualidades. Apesar disso, ela não deixava de criticar a dura
realidade vivida por muitos brasileiros. Também não deixava de incentivar a
solidariedade e chamar atenção para as falcatruas de uma política desrespeitosa
praticada no nosso país. Os convidados dela, em sua maioria, não eram mais que
produtos da indústria cultural brasileira ou personalidades que o SBT queria
emplacar na mídia. Ainda assim, Hebe fez parte de um tempo célebre da cultura
nacional, cantando ao lado de Roberto Carlos, Agnaldo Rayol e Demônios da
Garoa. Hebe entrevistou Mazzaropi, a presidenta Dilma, sempre com seu jeito
informal e leve, o que tornava acessível a suas conversas, independentemente de
quem era o entrevistado. Com Hebe nós ríamos, nos emocionávamos. Hebe tinha um
brilho tão grande que não precisou estar na maior emissora do país para se
tornar alguém inesquecível e ímpar. Mas também não escondia a alegria de estar
no palco do Faustão (se comportava como uma criança gritando: “Olhem, estou na
Globo!”) ou em uma entrevista no Fantástico.
Por fim, como nos resta poucas palavras em um momento desse,
basta dizer que é muito bom viver num tempo em que se é capaz de ver pessoas
com a grandiosidade de Hebe na ativa. Já que não tive a oportunidade de viver
nos tempos de Mazzaropi, de Chacrinha, ou enquanto viveram Tolkien, Lewis,
Machado de Assis ou Monteiro Lobato, pelo menos posso dizer que eu estive num
tempo onde viveu Hebe Camargo.
Descanse em paz, Hebe.
Hebe morreu na madrugada de sexta para sábado do dia 29 de
setembro de 2012, aos 83 anos, enquanto dormia. Sofreu de ataque cardíaco após lutar
bravamente durante anos contra o câncer. Ela tinha, pouco antes de sua morte,
acertado a volta para o SBT depois de uma temporada na Rede TV e se dizia muito
feliz. Uma eterna guerreira que nunca permitiu que o sorriso deixasse o seu
rosto.
Um comentário:
Por mais que a Globo tenha seu padrão Globo de Televisão, é no SBT onde a cara da TV brasileira ainda permanece.
E aos poucos essa cara vai indo embora como você disse.
Vai-te em paz, Hebe!
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