terça-feira, 28 de maio de 2013

Marco Feliciano, o arauto do ódio e da exclusão social

Escrevo este texto num momento de muita angústia, em que meu coração me instiga a desabafar. Se não o fizer, não conseguirei levar meu dia adiante. Existem coisas entaladas na garganta que precisam ser ditas e que devem ser expressas antes que seja proibido fazê-lo.

Tudo começou com o pastor Marco Feliciano. Sei bem que ele não é o arauto do ódio, porque antes já tínhamos Myrian Rios e Silas Malafaia, mas o Feliciano está num lugar onde não deveria estar. É legítimo (talvez não tanto, mas isso é outra discussão) que ele seja deputado, afinal, ele recebeu uma votação expressiva para isso e é aos seus eleitores que ele deve representar. Mas deve ficar claro o motivo da rejeição e dos protestos contra este deputado-pastor: hoje ele quer representar justamente as pessoas que não votariam nele: participantes de religiões de origem Africana, índios, feministas, gays. Enfim, as minorias.

Ele diz que deve permanecer na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias para “defender a família”. Que família?, eu pergunto. As famílias de mães solteiras? As famílias de pais solteiros? Famílias de pais divorciados? Famílias onde os pais são ausentes e os filhos são criados pelos avós, tios?  Não. Feliciano, ao falar de família, acha que todas são exatamente do jeito que ele e sua igreja querem que seja: pai, mãe e filhos. E, sinto dizer, a população brasileira não vive mais sob essa construção hegemônica de família.

Ainda assim, sob o guarda-chuva de Feliciano, estão amparados os discursos de todos os reacionários do país. E nenhum desses grupos é composto por gente boa: machistas, nazistas, defensores da ditadura militar e fundamentalistas. Afinal, esse discurso de que os gays serão culpados pela “destruição da família” não cola mais desde que o divórcio foi permitido por lei. Sobre divórcio, aliás, Jesus fala claramente e diz que “Moisés permitiu por causa da dureza dos vossos corações”. Mas sobre os gays... bem... Jesus nunca falou deles.
Não que eu negue que a Bíblia os condena. Disse apenas que Jesus nunca falou disso. Mas não é a questão deste texto. Eu aprofundei essas questões em outra publicação, que você pode conferir se quiser. E nem adianta usar isso como argumento nos comentários, porque este texto não se trata disso.

Voltando. O divórcio já foi um “golpe legal”, digamos assim, na construção evangélica da família. E as igrejas já tiveram que se adaptar a isso, se não, perderiam fiéis. Não vejo nenhum deputado esbravejando contra a lei do divórcio e propondo medidas que anulem este direito. Porém, não duvido que isso um dia possa acontecer se o Brasil virar, ao invés de uma democracia, uma teocracia.
Feliciano está me fazendo ter asco dos evangélicos, algo que eu tento com todas as minhas forças controlar porque, diferentemente da minha emoção, minha razão sabe que nem todos pensam e são como ele. Tanto é verdade que eu sou cercado de evangélicos e, por ser católico, também convivo com centenas de pessoas que têm os mesmos pensamentos defendidos por Feliciano. Mas não adianta. Feliciano instaurou estado de guerra neste país.
Desse modo, as coisas estão ficando “oito ou oitenta” e todos estão vendo apenas os extremos dos dois lados. Para os que não apoiam o movimento gay, acreditam que este é composto por um bando de baderneiros. E para os que não pensam como os evangélicos, acabam por julgar todos eles como atrasados intelectualmente, tal qual Feliciano.

Marco Feliciano, infelizmente, está a protagonizar um retrocesso gigantesco no nosso país. O Brasil, se continuar no ritmo que está, se tornará uma nação regida por leis ditadas pela Bíblia, da mesma forma que os países do Oriente Médio misturam o Estado com a religião e cumprem leis de acordo com suas orientações religiosas. Isso é muito, muito, muito perigoso.
Falam em “ditadura gay” porque, de certo, não sabem o que é ditadura. Acaso alguém está obrigando alguém a ser gay? Acaso as rádios estão proibidas de tocar música sertaneja para transmitir a voz da Madonna, da Cher, do Elton John? O movimento gay não está exigindo nenhum privilégio, apenas que sejam concedidos a eles pelos menos 76 direitos de cidadania que lhes são negados por conta da condição sexual deles. Exatamente: quem é gay perde, hoje, quase 100 direitos civis. E há ainda quem diga que ser gay é uma opção.

Por desconhecimento ou total falta de honestidade, a bancada evangélica negocia fisiologicamente com este governo – que cada vez mais me decepciona – contra programas educacionais e propostas legais de criminalização da homofobia. Enquanto isso, homossexuais morrem ou são agredidos por causa do preconceito. Sim, heterossexuais são vítimas de violência também. Porém, NINGUÉM é agredido na rua simplesmente por ser heterossexual. Parece difícil de compreender, de tão banal que é isso, mas trata-se de um fato: pessoas são agredidas por serem quem são. Só por isso.
As únicas exceções nessa história são as mulheres e o povo negro. Elas sim são agredidas simplesmente por serem mulheres; e para isso existe a lei Maria da Penha. Para os negros existe a lei que criminaliza o racismo, quando negros são violentados somente por causa da cor da sua pele. Mas para os gays... bem... eles podem ser diminuídos, violentados que nada vai acontecer. Dirão “ah, agora tudo virou homofobia”, contratarão um advogado que vai dar uma desculpa qualquer e o machão de plantão sai ileso, enquanto o outro, com o nariz quebrado e graves consequências psicológicas.

Por fim, preciso dizer que estou triste com o mundo. Triste de ver cristãos tendo como bandeira o ódio. Tristes por ver gente usando a palavra de um Deus que dizem ser de amor para tirar direitos de outros cidadãos, regrar a vida daqueles que são diferentes de si, limitar a existência de seres humanos.

E estou preocupado. Porque para político ladrão o Brasil se revolta facilmente e não é difícil incitar a população a rejeitar alguém que rouba. Mas quando a injustiça parte daqueles que usam a máscara do cristianismo, os seguidores do sujeito o defendem como defenderiam o próprio Cristo, espalhando ainda mais a violência e a intolerância e colocando, na boca daquele que pregou o amor e a justiça, uma mensagem de exclusão e condenação.

domingo, 5 de maio de 2013

Com DNA Tour, Wanessa exporta a música brasileira para o mundo


Wanessa chegou ao ponto mais alto da sua carreira. Amadurecida profissionalmente e vocalmente, lançou nesta semana o registro da sua turnê DNA, onde interpreta as canções do último disco, de mesmo nome. Além de um show de alto nível, comparado a produções internacionais, a gravação do espetáculo está à altura do que vemos no palco.
Três painéis assimétricos, mais um telão de led ao fundo, complementam a linguagem musical.

São três atos que representam, de início, as aflições humanas, o sofrimento, o purgatório; passando por assuntos terrenos, onde são experimentadas as paixões, o amor, os ambientes urbanos, o sexo e, depois dessa descoberta e da vivência desses sentimentos, a história nos leva ao encontro da paz, da plenitude, da felicidade.

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Figurino do primeiro ato do show, nas trevas
Para representar esses três momentos distintos, o show inicia com um prelúdio, onde Wanessa aparece imobilizada por uma camisa de força preta. No vídeo, todas os símbolos e movimentos remetem à angústia, à prisão, ao desconforto. A música de abertura é a que dá nome ao show, seguida por Stuck On Repeat (a versão remixada pelo americano David Audé, que chegou a ser classificada pelo New York Post como “a música mais dançante dos últimos anos”), Get Loud, Murder e Messiah.
Nos telões, confusão, loucura, desespero, pane, imagens confusas e escuras combinam com a coreografia de movimentos curtos e rápidos, o figurino negro e as feições, tanto de Wanessa quanto dos bailarinos, fechada, aflita.

Performance de Stuck on Repeat, uma das melhores
coreografias do show
O segundo ato começa com Fly, música que orna muito bem com o momento do show, que vai falar sobre as experimentações, com a entrega ao que o mundo tem para oferecer. O figurino fica mais leve, despojado e Wanessa entra em cena com um vestido vermelho, retratando as paixões que serão vivenciadas neste ato. O telão dá espaço para imagens urbanas, elementos da Terra.
Esta é a parte mais brasileira do espetáculo. As músicas em português começam a ser executadas, a começar por Deixa Rolar, com o funkeiro Naldo (única canção realmente dispensável no show), seguida por uma versão de Não Me Leve a Mal com muita percussão, bastante latinizada. Sem Querer, do terceiro álbum da cantora, ganha uma nova roupagem, com mais guitarra e uma pegada mais rock n’ roll. Wanessa lembra de sua fantástica e inigualável veia romântica ao cantar Não Resisto a Nós Dois, às lágrimas, acompanhada de um coro apaixonado e embalada somente pelo piano, dando mais leveza à música. A romanticíssima You Can’t Break a Broken Heart, de Diane Warren, compositora que já trabalhou para Celine Dion e Christina Aguilhera, emociona e traz à tona toda a qualidade e potência vocal de Wanessa, indiscutível.
Wanessa e Bryan Tanaka, em Blow Me Away, no segundo
ato
Mas o momento romântico é breve e Preta Gil entra no palco em uma das apresentações mais divertidas e animadas. Mostrando-se completamente à vontade, ela leva o público inteiro a dançar e cantar com força. Wanessa e Preta espelham uma sintonia única que faz de Amor, Amor, cantada pelas duas, um momento delicioso e irreverente.
Provando que o segundo ato é o mais rico, o show segue com Blow Me Away, interpretada numa cama, com os telões em chamas, numa apresentação caliente, sensual e empolgante com o dançarino responsável pela direção de coreografia, Bryan Tanaka, que já trabalhou com estrelas como Beyoncé, Rihanna e Jennifer Lopez.
Por fim, Shine It On, escolhida para ser o carro-chefe de divulgação do DVD encerra a parte “terrena” do DNA Tour.

Quando o espetáculo vai começar a falar da plenitude, do nirvana, da paz, do Paraíso, Wanessa chega com Armosphere, seguida pela animadíssima Hair & Soul, que sintetiza toda a proposta do show, conforme vou falar mais adiante. Esta última, aliás, rendeu uma homenagem da plateia nos moldes do que já havia sido experimentado nas passagens de Britney Spears e Demi Lovato no Brasil, quando o público levanta plaquinhas com a inscrição “OH!”, em dado momento da canção.
O espetáculo vira uma pista de dança quando começa Worth It e sobe o morro da favela, com as batidas do funk carioca em Sticky Dough. Por fim, um dos maiores sucessos da nova fase de Wanessa, Falling For U, encerra o show.
Figurino do terceiro ato do show

É preciso dizer que, por mais que a maioria das músicas sejam cantadas em inglês, o show não perde a essência brasileira. Wanessa mistura funk e samba em muitas músicas. A percussão, que dá ares de reggaeton e axé em algumas canções, é extremamente destacada e conta, até mesmo, com um latão para dar uma sonoridade mais crua a algumas canções. O maior ato do show, o segundo, traz uma veia latina e coreografias abrasileiradas. Nota-se claramente que a intenção de Wanessa é fazer música pop, genuinamente norte-americana, mas com uma cara inteiramente brasileira, única, numa junção feliz do que há de mais popular na nossa cultura com o que existe de mais vanguarda lá fora, como o dubstep.

A escolha por retratar três momentos com sentimentos diversos não é gratuita. Além de uma linguagem que retrata sentimentos comuns a qualquer ser humano, Wanessa quis ser a voz das mulheres, ilustrando a busca por conquistas, pelo espaço, pela independência, pela liberdade, pela felicidade. Assim, passamos do primeiro momento onde os bailarinos homens assassinam as mulheres (em Murder), tapam suas bocas, vendam seus olhos, prendem-nas com sua força, até que, libertas dessas amarras, elas encontram, por meio das paixões, do amor, do prazer, da experimentação dos sentimentos, a atitude (demonstrada, principalmente, em Amor, Amor: “poderosa, atrevida, ninguém se mete mais na minha vida”, diz a letra) e, então, chegam à felicidade plena, a independência, o companheirismo entre as iguais, a beleza presente na alma em cada uma delas (Hair & Soul pode ser classificada como o título desse ato: o cabelo representando a beleza externa, numa alusão às particularidades, à liberdade, às diferenças que são muito visíveis no capilar das mulheres; e a alma, que é a beleza interior, o que elas têm de especial no íntimo de cada uma delas), além de Sticky Dough, que é um verdadeiro confronto entre os sexos, provando que as mulheres não têm nada de frágil, nem de inferior.

Wanessa dança o show inteiro, canta muito com segurança. É mulher e brasileira, mostrando ao mundo o que alguém do “sexo frágil” do “terceiro mundo” é capaz de fazer. DNA Tour é cheio de simbolismos externos ao show, inclusive. Ele nos tira o complexo de inferioridade, mostrando do que o brasileiro é capaz, que a nossa cultura, nossa verdade é completamente intensa e pode ser dominante tanto quanto a norte-americana nos é por aqui. E tudo isso feito por uma mulher, que já experimentou a pobreza, passando por uma vida mais tranquila, com dinheiro advindo do trabalho do pai, num estilo musical que desde sempre foi vítima de preconceitos, também responsável por ela sofrer preconceitos, mas que hoje, neste novo estilo, ganha o mundo com elogios e apreciação internacional, mesmo sem um trabalho intenso de divulgação fora do Brasil.

Enquanto isso, por aqui, continuam chamando Wanessa de caipira, como se isso fosse um motivo para diminuí-la. Felizmente, nenhum preconceito é capaz de diminuir alguém que, com seu brilho próprio, é capaz de ser grande. E ela mostra isso a todo momento, na sua plateia, na sua mensagem, nas suas origens, na sua história e no seu DNA.

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